sexta-feira, junho 05, 2009

Metade

Escrevi pra um amigo que está longe e percebi o quanto realmente acredito em tudo isso:

Quando viajamos, quando mudamos de lugares físicos e quando mudamos dentro de nós, temos primeiro esperanças, mas aos poucos surgem medos, às vezes desespero.
Às vezes euforia e uma confiança que só por ela temos coragem de seguir em frente. Às vezes vontade de desistir de tudo.
Somos metades em busca das outras pessoas, dos outros sentimentos, das outras verdades.
Percebemos que pode ser um caminho sem volta, porque uma vez partido do destino de origem, nunca mais seremos capazes de nos tornar algo puro.
Somos contaminados pelos outros, somos contaminados pela magia de nos misturar e nunca mais teremos-nos inteiro, porque por cada lugar que passarmos, vai ficar um pouco de nós e vamos levar um pouco dele.
Felizmente, com o tempo é possível ter essa certeza, as dores deixarão saudades, as saudades são e serão memórias daquilo que vivemos de verdade.
Somos metades pelo caminho, quando partimos não deixamos nunca mais de caminhar, ainda que voltemos à origem, as origens serão várias...

Foto por Tales Tavares

Quando estava longe de casa, aos 16 anos, bastante machucada pela distância, meu pai me mandou algo que me marcou muito. Era assim desde antes, é assim desde então:

Metade - Oswaldo Montenegro
Composição: Oswaldo Montenegro

Que a força do medo que tenho
Não me impeça de ver o que anseio
Que a morte de tudo em que acredito
Não me tape os ouvidos e a boca
Porque metade de mim é o que eu grito
Mas a outra metade é silêncio.

Que a música que ouço ao longe
Seja linda ainda que tristeza
Que a mulher que eu amo seja pra sempre amada
Mesmo que distante
Porque metade de mim é partida
Mas a outra metade é saudade.

Que as palavras que eu falo
Não sejam ouvidas como prece e nem repetidas com fervor
Apenas respeitadas
Como a única coisa que resta a um homem inundado de sentimentos
Porque metade de mim é o que ouço
Mas a outra metade é o que calo.

Que essa minha vontade de ir embora
Se transforme na calma e na paz que eu mereço
Que essa tensão que me corrói por dentro
Seja um dia recompensada
Porque metade de mim é o que eu penso
mas a outra metade é um vulcão.

Que o medo da solidão se afaste,
e que o convívio comigo mesmo se torne ao menos suportável.
Que o espelho reflita em meu rosto um doce sorriso
Que eu me lembro ter dado na infância
Por que metade de mim é a lembrança do que fui
A outra metade eu não sei.

Que não seja preciso mais do que uma simples alegria
Pra me fazer aquietar o espírito
E que o teu silêncio me fale cada vez mais
Porque metade de mim é abrigo
Mas a outra metade é cansaço.

Que a arte nos aponte uma resposta
Mesmo que ela não saiba
E que ninguém a tente complicar
Porque é preciso simplicidade pra fazê-la florescer
Porque metade de mim é platéia
E a outra metade é canção.

E que a minha loucura seja perdoada
Porque metade de mim é amor
E a outra metade também.

Um comentário:

Ric Milk disse...

Deprimidinha você, hein!k Beijos